Trecho traduzido de Martin Page (Inédito)

dezembro 11, 2013 § 1 comentário

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Aproximo-me do espelho para me barbear; meu rosto entra num quadro em que é refletido. Pego meu gel de barbear hipoalérgico-hidratante frescor menta, espalho um pouco nas bochechas e naquele pequeno espaço onde passa a veia jugular por meu pescoço. Minha gilete tem três lâminas, fico feliz, assim rasgo sem dificuldade a grossa linha roxa.

O sangue surge a principio lentamente. Ele hesita a tomar para si esta imensa abertura que lhe é oferecida no lugar do confinamento monótono e rotineiro da veia humana. Este novo mundo, com seus tesouros e seus mistérios que ele jamais possuiu em seu claustro, o assusta e o atrai. Ele não imaginava que era tão pequeno; o sangue é vaidoso, jamais lhe veio à ideia de que não poderia jamais preencher a veia na qual o diâmetro é o universo, pois ele jamais esteve senão em um pequeno corpo de homem.

Entretanto, por que o sangue possui a loucura dos grandes, ele se lança imprudentemente da ferida do meu pescoço sobre a louça branca suja de pelos. Isto é tudo que terá como paisagem. Em seguida, irá descer pelo sifão e se misturar com águas sujas, chegar aos esgotos para terminar em taças de coquetéis de ratos gigantes.

Perco consciência, minha cabeça estala no chão do banheiro.

Houellebecq – livro e filme 1

março 21, 2013 § Deixe um comentário

Extensão do Domínio da Luta é um livro seminal, fundamental. Seu discurso cínico representa e denuncia o modo de vida do europeu pós 1990 – e por tabela, todos nós.

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Se o personagem é misógeno e antissocial, reconhecemos nele coisas que tentamos esconder em nós mesmos. Em sua edição inglesa recebeu o título de “whatever”, muito de acordo com a trama mas que poda um dos principais conceitos do discurso do autor; o domínio da luta versus o domínio da norma. O livro tem cara de romance de estreia com uma estrutura mais simples e rebelde do que o autor viria a desenvolver nos romances posteriores e em algumas passagens parece um manifesto. Em um dos momentos mais inspirados o autor elabora uma teoria completa do liberalismo, tanto econômico quanto sexual. Logo no primeiro capítulo ataca “les ultimes résidus, consternants, de la chute du féminisme.” Lançado no brasil pela editora Sulina, tem uma tradução muito competente de Juremir Machado da Silva, que mesmo não contemplando inteiramente o estilo do texto francês, aproxima muito a linguagem de Houellebecq ao português brasileiro, fazendo esquecer, às vezes, que se trata de texto traduzido.

 Lembre-se, mais uma vez, da sua entrada no domínio da luta.

extensao do dominio da luta

O filme Extension Du Domaine De La Lutte foi lançado em 1999 adaptado por Philippe Harel e o próprio Michel Houellebecq. Direto ao ponto, o filme é bem ruim. Exatamente por se manter próximo demais do livro. O protagonista imita a persona de Houellebecq até no modo de fumar, e ao longo de duas horas de duração escutamos dois (!!) narradores lendo trechos do livro. Falta linguagem cinematográfica. A fotografia é escura e atuação deixa a desejar, devido talvez à falta de ação em tela. O filme é bom apenas como sonífero.

 *consegui o filme pela internet, não há legendas em português nos sites mais populares e não sei se ele já passou ou se foi lançado no brasil.

Ce livre est dédié à l’homme

dezembro 25, 2012 § Deixe um comentário

MH1

Michel Houellebecq é um escritor francês bastante popular em seu país, é um destes autores contemporâneos que fazem a diferença. Mas eu nunca havia lido Michel Houellebecq, autor que eu ouvi falar mas que não chamara muito meu interesse, um desses escritores de títulos estranhos que eu bem poderia ficar sem ler. Daí que por acaso me recomendaram O Mapa e o Território; o último romance de Houellebecq coroado com o célebre Prix Goncourt. Li algumas críticas exaltadas na internet e devo dizer que não fui iludido em minha leitura. O Mapa e o Território é um romance que prende a leitura, intrigante… em uma palavra; um sucesso!

O Mapa e o Território narra a vida e a obra de Jed Martin, artista francês que vive em um futuro próximo. Um artista incapaz de manter uma vida social digna de seu nome, mas que se revela ser um grande talento. Ele começa fotografando objetos do cotidiano, objetos aparentemente insignificantes, mas aos quais se somam o olhar do artista. Após esta fase e sua saída da escola de belas-artes, Jed muda de objeto e começa a fotografar mapas da Michelin escolhendo os lugares que julga mais interessantes ou belos. Esta fase de mapas lhe garante reconhecimento no meio artístico e o começo de sua fortuna seguida de uma parceria com a empresa europeia. O nome da exposição que exibe seu trabalho é quem dá o nome ao romance “O mapa é mais interessante que o território”. O sucesso é enorme, mas o artista de humor volúvel abandona a fotografia para se dedicar à outro tipo de arte, a pintura. Ele inicia uma nova fase de 65 telas que lhe rendem uma fortuna enorme. Esta “coleção dos trabalhos” representa homens e mulheres em seu ambiente de trabalho em pinturas bastante detalhistas e realistas, bastante próximas a fotografias afinal. Estes quadros são vendidos após a primeira exposição organizada por Jed Martin : ele teve a boa ideia de representar pessoas conhecidas, homens de negócios que comprariam estes quadros negociados rapidamente à milhões de Euros.

O romance de Michel Houellebecq é um profundo testemunho do nosso tempo, um livro provocador, fruto de uma mente afiada que destila a cada página nossas contradições e preconceitos rindo das expectativas do leitor. A história de Jed é um subterfúgio para analisar o que é ser artista nos anos 2010. É um livro que não poderia ter sido escrito em outra década, o livro mais moderno que já li.

Uma outra intriga, às vezes mais forte e mais humana que a precedente, percorre o romance; é a história das trocas, sempre difíceis e esporádicas, entre Jed Martin e seu pai, que se aproxima da morte – uma morte que ele vai buscar em uma instituição suissa especializada em suicídios assistidos. Da mesma maneira que o escritor inseriu em seu relato personagens reais, esta instituição existe de verdade, e nesta incarnação, a eutanásia é aparentemente uma profissão como qualquer outra no país. Esta ironia, presente também em seus outros livros, se firma com uma marca de fábrica do autor.

Outra forma de ironia, com a qual Houellebecq se mostra muito familiarizado, é esta maneira de ridicularizar um personagem real através de um elogio disfarçado. Desta forma entram em seu romance fantoches da televisão, críticos literários e até outros escritores. Tornando-se impossível a Monsieur Houellebecq publicar um trabalho sem suscitar novas polêmicas. No Mapa, a maior polêmica acabou sendo a acusação de plágio. Desafiando as fronteiras da apropriação de conteúdo intelectual, o livro, como este post, copiou da internet (Wikipédia) diversos textos descritivos sem citar sua fonte. Este caso pode ser pesquisado em vários artigos e levantar boas reflexões sobre os limites das trocas que a internet pode proporcionar.

O Mapa E O Território foi publicado no brasil pela editora Record sem muito alarde, com uma capa escura que chama pouca atenção, mas com uma tradução competente. Outros livros como Partículas Elementares foram publicados pela editora Sulina, este, em sua edição francesa J’Ai Lu traz uma cinta com a foto do autor nos encarando com sua feição bizarra e dizendo “este livro é dedicado ao Homem”.

capa mapa territorio brasil

Começando pelo final; NEXUS de Henry Miller

novembro 30, 2011 § 1 comentário

Recentemente a Companhia das Letras levou novamente às livrarias o excelente NEXUS daquele que posso chamar sem medo de “meu escritor favorito” se não pela importância que prestou na minha formação como leitor, ao menos pelo numero de livros que possuo dele; quase tudo! não vou fazer listas, mas aproveito para mostrar as duas trilogias em edições que gosto muito.Apesar do design interessante da edição da Groove Press, o papel mole e plastificado falha a resistir leituras consecutivas e minha cópia de Tropic of Capricorn já está desmontando. O mesmo não se pode dizer da edição brasileira, capa dura, ilustração original, folha de guarda, folha de rosto ilustrada; impecável – e o papel que ainda tem cheiro de novo depois de 6 anos de comprado. A tradução foi feita pelo ótimo SERGIO FLAKSMAN, que tem dado conta de atualizar alguns livros com teor erótico; lady chatterley, lolita, mas também Orwell, Capote, Pamuk, Jonathan Franzen… o trabalho dele é impecável, não apenas uma tradução fiel, mas um belo texto em língua portuguesa por si.

Mas em 2012, apenas NEXUS restou desta edição da companhia das letras…SEXUS e PLEXUS esgotaram rapidamente apesar dos gritos de socorro deixados nos comentários do próprio site da editora.
O que torna, obviamente, muito mais difícil de vender o que é o terceiro livro da coleção. Retomando então o inicio do texto, a Companhia colou um adesivinho de 50% de desconto em comemoração aos 25 anos de editora. Sorte de quem aproveitou.

Uma noite destas, pouco antes do fechamento da loja, um casal frequentador da livraria estava lá fazendo sua feirinha cultural, hesitantes se valia a pena incluir NEXUS em sua compra. “sempre tive vontade de ler, mas não fica estranho começar pelo volume 3?” Respondi que não deveriam perder a oportunidade e que o livro valia muito mesmo separado da trilogia. Por exemplo; Trópico de câncer (1934), Primavera Negra (1936) e Trópico de capricórnio (1939) podem ser vistos como uma trilogia por retratar a fase parisiense de Miller, ou pela proximidade de seus lançamentos. Não se trata de uma trilogia no sentido de continuidade, mas de livros que se aproximam na temática e no estilo. Em seu primeiro livro publicado, Miller “cuspiu na cara da arte” e se distanciou da narrativa Realista em busca da aproximação entre Ser e Texto, da liberdade, da verdade; para tal também foi preciso quebrar com a linearidade, o que levou a Miller a desenvolver uma de suas mais notáveis características, a Narrativa Espiral – técnica profundamente analisada por James M. Decker em sua tese Henry Miller and Narrative Form- sem tradução em português, que me foi gentilmente cedida pelo autor e grande incentivador da leitura da obra de Miller, responsável também pela publicação da revista anual Nexus: The International Henry Miller Journal (http://nexusmiller.org/) – somente depois de dez anos do lançamento de Capricórnio Miller viria a lançar seu próximo romance, – mas não se engane ao pensar que Miller fora pouco produtivo – escreveu durante toda sua vida ensaios, livros de viagem, contos, e por que não; cartas – parte indispensável de sua bibliografia; já como escritor maduro, superadas as dificuldades pessoais e financeiras (e editoriais!), de volta aos Estados Unidos, surgia então Sexus (1949) e seriam preciso outros dez anos para concluir seu projeto chamado de A Crucificação Rosada com Plexus (1953) e Nexus (1959). Em tempo, Decker afirma que “The Rosy Crucifixion may appear chronological at first, but only a throughly uncritical reader could maintain such an interpretation for long” “A Crucificação Rosada pode parecer cronologica a principio, mas apenas um leitor sem visão crítica pode manter tal interpretação por muito tempo” Nesta nova trilogia a Narrativa Espiral é parte fundamental do texto que mistura memória, sonhos e microensaios. O que faz não só cada livro, mas cada capítulo, partes autônomas – respondendo a pergunta acima.

Falar com tanta paixão de um dos meus livros favoritos me fez tirar da prateleira a minha cópia de nexus com a inscrição Leonardo S Bandeira – natal 2006. Eu queria verificar se o explicado acima era mesmo verdade, qual era a impressão que um novo leitor teria ao começar por este volume, mas o que deveria ser uma página acabou puxando outra… Na primeira página de NEXUS –  Au! Au au! Au! Au! – Henry está acordando de um devaneio onde se encontra reduzido ao nível de um animal – Au! Au au! Au! au! Eu grito, mas o mundo só percebe um sussurro – é difícil definir o que está acontecendo, nomes brotam nas páginas, o que eles querem dizer? Na narrativa de Miller a Realidade e a Ficção se misturam com o Sonho e o Devaneio – Estão aí companheiros? nenhuma resposta – O autor frustra qualquer expectativa que possuímos de um “começo” de livro que introduz e situa o leitor; logo em seguida estamos falando sobre Dostoievski e o fluxo narrativo segue carregando o leitor; esqueci imediatamente dos livros que peguei emprestado, lia no ônibus, lia trechos para meus amigos, para namorada… só não posso dizer que foi uma leitura rápida, pois algumas páginas eram são tão fortes que me obrigava a estacionar e as ler varias vezes. No capitulo 10 e 11 temos um dos momentos mais dramáticos da obra de Miller, quando ele é abandonado sozinho em Nova York por sua esposa que viaja a Paris. Fui arrebatado pela força dos sentimentos e beleza do texto.

Os livros da Crucificação Rosada podem ser descritos como um longo monólogo onde Miller relata a história de um homem que sonha em se tornar escritor, mas que não consegue se libertar de um estado mental improdutivo e da pobreza em um Brooklyn dos anos 1920. Podem também ser descritos como uma longa carta de amor à uma mulher que o hipnotiza em uma rede de mentiras, malfeitora e benfeitora, pois é a única a acreditar inteiramente no talento de seu amado e a busca deste; ela o convence a abandonar o emprego para se dedicar a escrita e alimenta sua mente com ilusões a respeito da cidade dos artistas, Paris, trazendo dinheiro para casa de maneiras sempre suspeitas ou através pequenos favores.
Cada página é um canto de dor, vida, arte, pessoas comuns, grandes autores, amor, sexo, deus, mentiras, tédio. Miller mistura fragmentos do passado, presente e futuro para fugir de uma análise simples de causa-e-efeito em busca de significados mais profundos, até a Crucificação do artista; tema de toda obra.

trecho do capítulo 11:

It was after I had opened my eyes and found that I was alone, though not deserted, not abandoned, that instinctively I raised a hand and placed it over my heart. To my horror there was a deep hole where the heart should have been. A hole from which no blood flowed. Then I am dead, I murmured. Yet I believed it not.

At this strange moment, dead but not dead, the doors of memory swung open and down through the corridors of time I beheld that which no man should be permitted to see until he is ready to give up the ghost: I saw in every phase and moment of his pitiful weakness the utter wretch I had been, the blackguard, nothing less, who had striven so vainly and ignominiously to protect his miserable little heart. I saw that it never had been broken, as I imagined, but that, paralyzed by fear, it had shrunk almost to nothingness.

I saw that the grievous wounds which had brought me low had all been received in a senseless effort to prevent this shriveled heart from breaking. The heart itself had never been touched; it had dwindled from disuse.It was gone now, this heart, taken from me, no doubt, by the Angel of Mercy. I had been healed and restored so that I might live on in death as I had never lived in life. Vulnerable no longer, what need was there for a heart?Lying there prone, with all my strength and vigor returned, the enormity of my fate smote me like a rock. The sense of the utter emptiness of existence overwhelmed me. I had achieved invulnerability, it was mine forever, but life—if this was life—had lost all meaning.

My lips moved as if in prayer but the feeling to express anguish failed me. Heartless, I had lost the power to communicate, even with my Creator.

Duas vezes os Três Mosqueteiros

agosto 9, 2011 § Deixe um comentário

…mais importante que ler, é reler
Desde que li esta frase em um livro de Borges, reflito sobre seu significado e olho para os meus velhos livros na estante com a expectativa de uma  redescoberta, de fazer uma leitura totalmente diferente da primeira, ler um livro diferente. No entanto, difícil é resistir ao novo, ao  desconhecido, então continuo como um consumidor voraz de livros, desmerecendo talvez o valor de  minha pequena coleção; sim, pois poucos livros que li nos ultimos anos tiveram em mim o mesmo impacto que as obras de Voltaire, Balzac, Henry Miller, ou mesmo coisas mais casuais como A Ilha do Tesouro – um dos favoritos  aos 14 anos.
Outro grande favorito era o Três Mosqueteiros, que li  naquela coleção da Abril em 2003, foi meu primeiro livro de Dumas, catei tudo que consegui achar dele em seguida, sempre uma leitura muito leve e rápida,  perfeita -imagino- para o formato Folhetim onde  foram publicados.

Veio a calhar então uma nova e charmosa edição da Jorge Zahar, em formato de bolso, precinho camarada e uma tradução respaldada. Decidi então por em  pratica o axioma supracitado e comecei a (re)ler o  livro no caminho do trabalho de ônibus. Um capítulo na ida, um na volta, às vezes dois. Talvez eu devesse ter escolhido um lugar melhor, pois as risadas que a leitura me provocava não eram nada  discretas.
Muita gente nem imagina que Os Três Mosqueteiros é um livro hilário! E isso não somente pelos personagens fanfarrões, situações esdrúxulas; também pela interferência do autor -algo condenável na literatura moderna- que faz graça de seus próprios  personagens;
“Bonacieux chorou como um autêntico dono de armarinho, não sendo de forma alguma homem de  espada, como ele mesmo admitiu”.
Os Três Mosqueteiros é também um livro “de época”, mesmo quando foi publicado, em meados do sec. XIX, pois se passa 200 anos antes em volta do evento  histórico do Cerco de La Rochelle. Ainda que, como de costume, o autor não seja factual, inventando  histórias de amor e personagens que jamais existiram, é muito divertido imaginar estes  personagens reais e suas motivações secretas.  Relendo o livro pude notar referências históricas  que me passaram despercebidas antes, ainda que alguns nomes já entreguem o desfecho de alguns  personagens, como a relação Felton/Buckingham, o  desenvolvimento destas ações são o que tornam a  narrativa interessante; nenhum spoiler é capaz de  spoil o livro, queremos saber não O Quê, isto está  nos livros de história, mas Como, isto pertence a  imaginação de Dumas.
Além do livro, baixei na internet diferentes adaptações para cinema e televisão, sendo a que mais gostei o filme de Richard Lester -diretor de Help! e outros filmes dos Beatles- para simplificar; é uma perfeita adaptação do/de livro para o cinema. Tudo funciona. Talvez o mais complicado de reproduzir  sejam os combates de esgrima, difíceis de imaginar  até mesmo na leitura pois é algo que não possui registro histórico e em outros filmes sempre parecem  artificiais, não aqui, apesar de coreografadas, as lutas passam a sensação do risco de morte e de  improvisação. O humor é muito presente também,  balanceado perfeitamente com a intriga.
Como toda (boa) adaptação, não se trata se uma cópia fiel do texto, e algumas mudanças precisaram ser feitas para enxugar o filme; personagens foram cortados, outros foram misturados, os cenários foram reduzidos, separei as mudanças em alguns pontos  importantes da trama:
No primeiro duelo, D’Artagnan:
Livro: Mata Jussac, conhecido como grande duelista
Filme: Jussac reaparece no final para o clímax  dramático

 

Com a senhora Bonacieux:
Livro:
D’Artagnan já mora de aluguel com Bonacieux,  este se aproxima do herói pedindo socorro no rapto  de sua esposa – que ainda não apareceu.
Filme: D’Artagnan conhece a sra. Bonacieux assim que  chega na estalagem, mais tarde fazem sexo.

A Rainha:

Livro: presenteia Buckingham com agulhetas de  diamante em um encontro secreto.
Filme: presenteia um colar de grandes diamantes e  uma grande luta acontece.

 

Viagem para Londres (maior mudança):

 

 

 

 

 

Livro: cada mosqueteiro é derrotado em um diferente  lugar, D’Artagnan chega a Londres após uma luta com  Wardes. D’Artagnan vai em busca de seus companheiros  APÓS completar sua missão.
Filme: os três mosqueteiros são atacados no mesmo  local, D’Artagnan luta contra Rochefort, Planchet  ajuda os Três a encontrar D’Artagnan na festa da  Rainha, onde um novo combate acontece.

além de claro; Grimaud, Musqueton e Bazin não  aparecem no filme.

Um -nada pequeno- detalhe que pode passar desapercebido é que o filme cobre apenas metade do  livro(!!). Bem, mais ou menos, apesar de não conter nenhuma divisão explicita, o livro de dumas possui  dois momentos bem distintos. A primeira parte trata  do caso das agulhetas de diamante da Rainha, a  segunda cobre os eventos históricos do cerco de La Rochelle, com foco na personagem Milady. É notável a diferença de estilo de uma parte para outra; ao fim  do livro não se tem os mesmos gracejos do começo, o clima é sombrio, com passagens eróticas, e a  história é mais arrastada, demorando mais capítulos  em eventos pequenos, como o jantar dos quatro amigos  no meio do campo de batalha ou no cativeiro de Milady chega até a ficar um tanto enfadonho. O filme cobre, portanto, apenas a primeira trama – fazendo  todos os ajustes necessários para criar um Final  onde no livro segue-se normalmente. Tudo muito bem feito, mesmo forçando um ‘final feliz’ entre o  mocinho e a mocinha salva.
Porém tal decisão parece ter acontecido durante o  processo de filmagem, pois foram gravados dois filmes no lugar de um (!!), houve até um processo aberto pelos atores ao perceber tal situação – exigindo receber por dois filmes, e não um.
O segundo filme é chamado Os Quatro Mosqueteiros, com D’Artagnam já promovido, ou A Vingança de Milady, é o filme que irei assistir hoje a noite, e estou muito curioso para saber como eles amarraram toda a história… 🙂

Alguns albums de 2017…

janeiro 20, 2018 § Deixe um comentário

Em Portugal, ouve-se muita música portuguesa na estação de rádio Antena 3. Aos sábados há um programa A3.30 com o ranking semanal de melhores musicas nativas, de onde eu conheci e passei a apreciar novos artistas, sempre nos primeiros lugares este ano estavam Luís Severo e Benjamim

Escola, Amor e Verdade, Cabeça de Vento, Boa Companhia… todas as músicas dentro dos 40 minutos deste release são para memorizar as letras e embalar o dia-a-dia urbano.

Metade das musicas cantadas em Inlês pelo Barnaby me deixaram um pouco pé atrás com este disco, depois do Benjamim gravar sozinho um dos meus favoritos no ano passado Auto-Rádio. Mas com Dança com os Tubarões e principalmente Terra Firme, o disco foi entrando na banda sonora das noites em que eu acalmava Aurora e a punha a dormir.

Para fechar a trinca de discos portugueses os Stone Dead arrancam com Blooze e imediatamente remetem aos Supergrass, mas no restante do album tem toda a sopa de influencia das bandas de rock-psicodélico. Apesar de ter ouvido muito o som dos Ganso (O que há por cá) e Cassete Pirata (pó no pé), acho que este é o LP que melhor preenche os dois lados da bolacha – ouvi no Bandcamp como todos os outros acima.

Este ano houve vários lançamentos de cantoras jazz, porém todos bastante medianos. Teve a Norah Jones que a Blue Note colocou o Lonnie Smith como acompanhamento sem grande efeito, a Diana Krall a cantar standards com uma voz amadurecida mas piano sempre medíocre, a Imelda May tentou uma guinada necessária de estilo mas ainda não se encontrou. A Carla Bruni lançou um álbum que poderia ser dos Nouvelle Vague e a Charlotte Gainsbourg não me convenceu. De todos estes gostei mesmo da Stacey Kent a cantar Photography. Os arranjos em todo o álbum são suaves e a Stacey passeia pela orquestra como um maestro.

E por falar français o melhor álbum da terra do croissant em 2017 foi o da novata Juliette Armanet, Petite Amie segue uma linha estética francesa clássica (até na capa) num disco pop com letras muito ricas e técnica vocal para desafiar qualquer aspirante à Karaokê, The Voice ou Idol. Há um pequeno sabor de Julien Doré aqui, e até trabalharam em um dueto. Mas o Julien fechou o ano com o seu pior trabalho até então, ao insistir na fórmula do album anterior (Love) o chamado “&” ficou abafado. Quem também lançou o pior trabalho da carreira foi o Mathieu Chedid com “lamomali” forçou o limite da amálgama frança-africa e apesar de bons momentos como Un âme, -M- ficou apagado em seu próprio álbum.

Da Belgica, tão bom quanto, senão melhor, veio a Lisza. Com produção e composições do Vincent Liben. O album La vie Sauvage passou totalmente despercebido até mesmo na sua terra local, o videoclipe acumulam pouquíssimos views – exemplo de que mesmo com música excelente, não se consegue nada sem o empurrão das gravadoras.

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Também da Bélgica, a dupla Lorenzo Gatto e Julien Libeer apareceu para mim no disco Diapason d’Or com a “Kreutzer  I. Adagio sostenuto – Presto” em uma interpretação tão energética e tão bem registrada que se tornou um dos meus albums favoritos do ano – e o meu álbum de música clássica favorito de sempre. É de se colocar no volume mais alto.

Flo Morrissey e Matthew E. White tem neste Gentlewoman Ruby Man um excelente disco de colaboração (muito melhor do que o mais aclamado Kurt Vile / Courtney Barnett) é um disco de covers com atmosfera etérea e repertório muito mais contemporâneo do que se vê neste tipo de álbum. Talvez este seja um bom momento para lembrar que o Beck demorou demorou e lançou este ano um disco fraquinho que ninguém gostou. De volta para a Flo, adorei a versão de Grease e de Heaven Can Wait (do Beck + Charlotte Gainsbourg).

Eu NUNCA gostei do Mac Demarco, tinha té algum preconceito com ele. Mas bastou ouvir Still Beating uma vez, e virou uma das minhas músicas favoritas do ano. Gosto tanto da letra, da clareza do som do violão / produção, do estado de espirito. Todo o álbum segue esse estilo e não há muitas surpresas, mas fico muito surpreso de ver que o disco não foi tão bem recebido e não apareceu alto nas outras listas de melhores do ano: enquanto quase todas revistas colocavam os loopings insuportáveis do LCD Soundsystem em destaque… vai entender

Agora estranho mesmo é eu ter de coçar a cabeça para tentar lembrar pelo menos um álbum de metal para colocar nessa lista. Tive que ir lá pro começo do ano pra falar do Mastodon que com Emperor of Sand tentou recuperar um pouco da moral dos fãs antigos perdida após o Once More Round the Sun. O resultado é um álbum que trás todos os elementos que a banda já explorou na sua carreira (em especial se considerar o EP bonus lançado pouco depois) de forma madura e concisa. É o meu disco de metal favorito de um ano com muitos e muitos releases medianos e de novas bandas que, para mim, só receberam atenção pois está tudo muito sem graça e sem inovação;

DESCOBERTA DO ANO:

Se teve um disco que “mudou minha vida” este ano, foi este LP do Duke Jordan de 1974. Esse ano, devido ao trabalho, ouvi muita musica instrumental e portanto muito Jazz. Na fila de sugestões do Youtube à partir do orgão do Lonnie Smith descobri a música Glad I Met Pat. O que dizer além disso? Posso dizer que além dessa, todas as faixas do disco são belíssimas e o melhor exemplo de Piano que eu posso sugerir pra qualquer pessoa interessada neste instrumento. Está no meu Top 10 álbuns de todos os tempos.

 

 

 

Que tal? uma tradução mais natural.

maio 14, 2015 § Deixe um comentário

(este é um rascunho antigo que não concluí, vou liberar no blog como está já que não tenho mais pretensão nenhuma em desenvolver esse projeto ; os exemplos são comparativos de minha tradução com a publicada pela Rocco)

-Tentar, na medida do possível, eliminar a sensação de que estamos lendo um texto “traduzido”

-Devemos aceitar, sem ressalvas, de que muitas expressões em lingua estrangeira simplesmente não funcionam em português!

-Nomes proprios; adaptar ou manter a grafia original? Qual o grau de distanciamento que isto pode causar e até onde o que vale para nomes próprios valerá para nomes comuns?

Antônio sempre contou sua idade em anos de cachorro. Quando tinha sete anos, se sentia gasto como um homem de quarenta e nove; com onze, estava desiludido com um velho de setenta e sete anos. Hoje, com vinte cinco anos, desejando uma vida mais tranquila, Antonio tomou a decisão de cobrir seu cérebro com o manto da estupidez. Não poucas vezes ele constatou que “inteligência” não passa de uma palavra bonita para designar idiotices bem escritas, é um termo tão pevertido que muitas vezes é mais vantajoso ser um burro do que um intelectual sacramentado. A inteligência nos faz infelizes, solitarios, pobres, enquanto a aparência de inteligência oferece uma imortalidade de papel de jornal e a admiração daqueles que acreditam em tudo que lêem.

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Sempre parecera a Antoine contabilizar sua idade como os cães. Quando tinha sete anos, ele se sentia gasto com um homem de quarenta e nove anos; aos onze, tinha desilusões de um velho de setenta e sete anos. Hoje, aos vinte e cinco, na expectativa de uma vida mais tranquila, Antoine tomou a decisão de cobrir o cérebro com o manto da estupidez. Ele constatara muitas vezes que inteligência é a palavra que designa baboseiras bem construídas e lindamente pronunciadas, e que é tão traiçoeira que frequentemente é mais vantajoso ser uma besta que um intelectual consagrado. A inteligência torna a pessoa infeliz, solitária, pobre, enquanto o disfarce de inteligente oferece a imortalidade efêmera do jornal e a admiração dos que acreditam no que leem.

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Resenha Submissão Michel Houellebecq

fevereiro 25, 2015 § 2 Comentários

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Achei  Soumission o livro mais fraco de Michel Houellebecq, se não fosse o numero de vendas garantidas pro causa do nome do autor na capa, talvez nem recebesse uma tradução em português; mas por quê?

Antes de tudo, Submissão é bastante diferente das expectativas geradas pelas noticias/polemicas divulgadas na mídia francesa e americana. É gritante que tenham divulgado (inclusive na capa do Charlie Hebdo de 7 de janeiro) que o personagem do livro se converte ao islã, esqueceram de usar a tarja ==SPOILER ALERT== pois o ramadã só ocorre nas páginas finais do livro.

Imagino que o leitor brasileiro terá dificuldade imensa na leitura, tamanho o nível de referências políticas e sociais francesas presente no texto. Em alguns momentos é como ler um editorial do LeMonde – tudo parece muito local no texto e pouco universal, característica muito melhor equilibrada nas obras anteriores de Houellebecq. Me pergunto se encherão o texto com notas de rodapé, espero que não, mas o leitor fora da França se sentirá alienado.

Em alguns momentos o autor alcança o sublime, uma prosa que esperamos de um escritor do primeiro escalão, há por todo o livro uma ideia de fechamento de ciclos em nossas vidas. Seja a vida amorosa, profissional ou intelectual. O “depressionismo francês”, marca do autor, está presente e potencializado pela presença constante de Joris-karl Huysmans, símbolo da Decadense do fin-de-siécle. Soumisson é talvez a mais bela homenagem feita a Huysmans desde Oscar Wilde.

Não há uma critica ao Islã, há muito mais elogios, porém Houellebecq não nega o seu ponto de vista. Sem demagogia, o ponto de vista é de um homem heterossexual europeu bem formado, que possui ideias pré-concebidas como qualquer um de nós, não há tentativa de usar a voz de outra classe social, ou raça.

O principal problema de Soumission é seu protagonista. Ele é apenas um observador em um país que ultrapassa grandes mudanças. Não toma ação em nenhum nível coletivo. Além disso, o protagonista é menos informado do que a média, ou menos informado do que poderíamos esperar de alguém com seu perfil. Por este motivo o livro se torna didático, mastigadinho, explicadinho, enquanto François, sempre muito interessado, pergunta aos seus amigos e colegas de trabalho qual a situação política do país e da religião muçulmana.

Este excesso de didática torna o texto muito simples, muito distante do autor de Partículas Elementares onde os micro-ensaios traziam dezenas de ideias em apenas uma página e o ácido escorria a cada parágrafo.

Como em Admirável Mundo Novo, que também discutia um futuro distopico próximo, Soumission é um livro melhor na discussão que levanta do que em sua prosa  e estilo. Houellebecq previu uma França muito diferente em 2022, declarando em uma entrevista que achava que era uma data próxima demais para um partido muçulmano vencer as eleições na franca, mas justificou que este era seu lado “bestseller”, a escolha da data também torna possível a presença de toda a cena política francesa dos dias de hoje, lá temos Sarkozy, Hollande, Le Pen… senti falta de conhecer melhor Mohammed Ben Abbes. Mais páginas além das  exatas 300 (flammarion) seriam bem vindas, mas as únicas palavras que aparecem na página 300 fechando o livro são

 

Je n’aurais rien à regretter

 

ps* Se você nunca leu Michel Houellebecq e se interessa pelo autor, recomendo seguir a ordem cronológica de seus romances começando por Extensão do Domínio da Luta. Submissão será publicado no Brasil pela edições Alfaguara.

Entrevista citada:

http://www.theparisreview.org/blog/2015/01/02/scare-tactics-michel-houellebecq-on-his-new-book/

Meus hábitos de leitura

novembro 7, 2014 § Deixe um comentário

2014 está acabando e percebo que este foi o ano que menos li desde que comecei a anotar os títulos dos livros em meus cadernos todos os anos. Um total de 16 títulos, sendo que destes muitos poderiam não estar lá, pois foram lidos parcialmente, ou por motivo de trabalho.

Este ano li A Besta Humana de Émile Zola e O Cortiço de Aluízio de Azevedo e O Cheiro do Ralo (de uma sentada só! – muito parecido com o filme). Todo o resto foram releituras ou não ficção como Dias de Feira do Júlio Bernardo e Pavões Misteriosos do André Barcinski.

Quando eu trabalhava na livraria, lia de 3 a 5 livros por mês, o acesso e a oferta eram muito fáceis. Mas a frustração constante de não encontrar nada que me agradasse, que não julgasse um belo exercício em perda de tempo, me fez abandonar muitos de meus hábitos de leitura uma vez afastado deste ambiente.

Sempre achei livro muito caro, ou melhor, um valor além das minhas despesas. Mas livros são objetos extremamente acessíveis, é fácil encontrar títulos aleatórios de graça ou muito barato em qualquer lugar. Por isso eu sempre acabei lendo coisas que caiam em minha mão… e saindo com um gosto amargo na boca.

A maior parte dos livros que li foram em ônibus. Dificuldade de concentração em casa, sonolência aguda,  poucos intervalos entre uma coisa e outra… fones de ouvido (estes são o principal concorrente de minha leitura fora de casa, mas prefiro ler a ouvir musica em um ambiente com muito ruído). O ônibus acabou se tornando um ambiente privilegiado para leitura pois eu sempre sabia quanto tempo teria para terminar aquele capítulo, que não encontraria ninguém conhecido -só às vezes. Meu ritmo sempre foi um capítulo na ida, um capítulo na volta. Quando estes eram curtos ou compridos demais era preciso improvisar. Mais um capitulo na pausa do almoço. Isso acaba de mudar, pois vou de carro para o trabalho.

Terminada a leitura, escrevo no caderno e uso a seguinte notação:

++           muito bom

+             bom

–              ruim

—             muito ruim

Difícil anotar livros muito ruins, pois abandono a leitura rapidamente, sem pudor, e largo o livro em algum banco na rua, com pena da próxima pessoa que vai encarar aquilo. Felizmente apago da memória titulo e autor, e não saberia dizer aqui qual foi o ultimo livro que fiz isso, apenas a imagem da capa restou, por enquanto.

A Besta Humana e O Cortiço foram, para mim, livros absolutamente fantásticos, inacreditáveis. Tão bons que me dou por satisfeito serem estes as novas narrativas que conheci este ano. No resto do tempo, eu pegava um capítulo de Extensão do Domínio da Luta ou Partículas Elementares para saciar a coceira por uma boa literatura.

Este ano vi muito poucos filmes também, apenas 30. Séries de TV eu não consigo mais. Não dá mais pra mim, acho tudo um saco… assisti apenas alguns episódios de Louie e Game of Thrones “ao vivo” na HBO.

Com dois  ++ apenas os filmes RUSH, Frances Ha, Le vent se lève, T.S. Spivet, Super 8, Tim maia e Jersey Boys.

O que cresceu bastante foram os videogames e os CDs. Fim do ano passado vendi o XBOX e comprei um Nintendo 2DS e um Nintendo WiiU. Pra não pesar no orçamento, vendi muitas coisas no mercado livre e outros fóruns, vendi CDs raros que estavam com preço alto, coleções que não me interessavam mais. Assim, com um baixo investimento me tornei um consumidor de produtos originais, desenvolvendo uma relação muito mais afetiva com cada jogo. Com muito mais satisfação que eu tinha com o Xbox destravado e mil jogos à disposição. Melhor jogo este ano para mim foi The Wonderful 101.

Nos CD’s aumentei violentamente a quantidade de discos de minha coleção de MPB, o maior êxito foi a quadrilogia dos discos do Sérgio Sampaio. Em um golpe de sorte ganhei o Bloco na Rua o Cruel uma vez só e corri muito pra encontrar o Sinceramente que estava esgotado. Bandas novas que fiquei muito fã são o Fauve e o Cérebro Eletrônico. Quando vem algum adesivo, colo também no caderno.

Se li poucos livros, li muitos blogs, li muito sobre política, li muita manchete na internet. Este ano eleitoral, logo depois de um semestre marcado por protestos em todo os lugares, mudei alguns de meus hábitos para acordar e ligar a rádio para ouvir as noticias, sair do trabalho e sintonizar para ouvir os comentários. No terminal de ônibus pegar os jornais diários para saber o que era destaque. Foi uma frustração muito grande para mim, com tudo que tudo que vi, li, acompanhei, discuti… o resultado das eleições com a reeleição de Alckimin em SP, Pezão no Rio e Dilma Roussef no País. Nos principais pólos de protestos que moveram o país de junho 2013 à copa do mundo 2014 não mudou nada. Agora abro uma notícia, um blog, me pergunto se vale a pena acompanhar a política.

 

Conselhos a um amigo escritor.

junho 10, 2014 § Deixe um comentário

Fala amigo!

Puxa, queria muito poder sentar com você para discutir melhor o livro.
eu já havia lido um trecho um tempo atrás, então sei que é algo que está na sua cabeça a bastante tempo.

Em relação ao texto, eu não considero ele ainda “pronto”, acho que você precisa entrar mais na personagem, fazer uma oficina para conhecer esta mulher melhor.

Problema estrutural só encontrei um ; No terceiro parágrafo você muda para a primeira voz em discurso direto. Mas há um problema grave, o leitor não foi inserido na cena. Nós não sabemos com quem a mulher está falando ou em que local ela está. Isto é um problema pois o texto inicia na terceira pessoa. constroi uma cena, mas que fica incompleta pois não coloca o leitor no local do monólogo.

Sugiro você escrever um paragrafo entre o segundo e o terceiro para situar melhor a cena. imagine um cenário de teatro e mostre para o leitor.
Importante!
Com quem ela esta falando? uma colega de ponto? um cliente antes do programa? depois do programa? apenas um amigo em um bar?

Feito isso, eu sugiro que você programe uma manhã livre, reflita durante meia hora, se conseguir – mais, em quem é esta mulher e o que ela tem pra dizer. Não escreva nada, apenas pense nela. Em seguida leia o monólogo em voz alta sem interrupções. Após a leitura, ajuste o que você identificou como desvio na voz da personagem. O que faz sentido para ela, o que tem de interferencia do autor nela.

EU achei a voz dela muito ocilante. acho que isso tem que ser melhorado. Acima de tudo, EVITE o tom “didático” que surge muitas vezes. Evite frases afirmativas absolutas, verdades prontas. Elimine completamente as notas de rodapé. Isso não é trabalho para o autor. deixe para a edição comentada, que o editor coloque notas se julgar necessário. Eu não acho que são.

exemplo do tipo de frases super-afirmativas que estão fora de lugar ; “**********************************8”
“**************************************************”
“*******************************” contradita logo em seguida por “**************************************”

é importante não ser didático

A personagem precisa falar, faça um desenho dela e cole em sua frente na mesa de trabalho, olhe para ela sempre, a voz é dela.

Faça um resumo da personalidade dela e cole ao lado do desenho.

Desenhe uma linha, ponto A é o momento onde o livro começa, ponto B é o momento que o livro termina. Reflita por que você decidiu mostrar este momento na vida daquela mulher.

Alguma coisa precisa acontecer entre o ponto A e o ponto B, isto é muito importante. Isso responde o que acontece nesse livro e por que eu deveria lê-lo.

“Documentos em ordem, pode ir”, disse o soldado. (p.48)

dezembro 17, 2013 § Deixe um comentário

Interrompo a leitura do livro Vida e Época de Michael K para registrar alguns pensamentos sobre o livro. Pesquisei e vi que o mesmo está esgotado, apesar de vários outros livros do autor permanecerem disponíveis pela Cia. Das Letras. Com 50 páginas de história, é possível ver que J. M. Coetzee é um escritor acima da média (na verdade, com 15 páginas eu já estava fisgado). A forma que escreve é universal, fala-se da África do Sul, mas é possível sentir os ecos da falta de liberdade no dia-a-dia de minha própria vida. É sobre liberdade que o texto tem me feito pensar, e é terrível imaginar a situação social narrada no livro como algo real e tão próximo. Pra quem quiser ter uma ideia de como se respirava o ar na África do Sul de algumas décadas atrás, Coetzee nos transporta em um discurso sem demagogia, propaganda, ideologia. Chega a ser estranho um relato sobre este país sem as palavras Apartheid, Negro, Branco, Opressão…. elas não aparecem no discurso. Não há esta rotulação maniqueísta, simplista. É uma escrita que devemos ser gratos por existir, gratos por haver um registro tão humano.Image

dezembro 10, 2013 § Deixe um comentário

Entro no banheiro. O azulejo frio sob meus pés me tranquiliza, existem mesmo coisas imutáveis neste mundo, que são incapazes de chorar e que podemos colar com cimento. O azulejo possui uma utilidade definida, ele serve para se colocar no piso, nos muros, chegando até aos tetos. Mesmo colado sozinho ou junto a milhares de congêneres, ele será sempre frio. As únicas coisas que podem mudar isso são os meus pés e a temperatura do aquecedor.

Não se costuma falar do destino dos ladrilhos partidos ou quebrados, eles são rejeitados, massacrados pela eugenia industrial; para eles, ao menos, não damos esperanças de que terão, apesar de tudo, um lugar para ir, um banheiro de reabilitação.

Eu adoraria ter esse tipo de psicologia fisiológica; feliz quando está calor, triste quando está frio. Certamente eu gastaria muito dinheiro para me manter aquecido, mas seria uma vida mais feliz se meu humor não dependesse mais de fatores tão volúveis quanto o amor, a atenção, o destino da humanidade.

(tradução inédita do livro Une Parfaite Journée Parfaite, Martin Page. Points, p.12)

Mercivoir

novembro 25, 2013 § Deixe um comentário

Todos nós sabemos que viajar é a melhor maneira de aprender uma língua estrangeira, mais ainda se não tivermos interlocutores em nossa língua nativa, ou em uma língua intermediaria (como o inglês). Neste cenário, somos “forçados” a utilizar todas as ferramentas obtidas nos cursos comunicativos e nos manuais de língua, sem que haja outro recurso além da mímica – o que nem sempre funciona.

Tudo isto é bem conhecido, porém há ainda um outro aspecto que pode chegar como uma surpresa para o viajante inexperiente; Em outro país, aprendemos também outros costumes. São coisas que vão além dos clichés e não aparecem em livros, pois mudam constantemente. Pode ser uma maneira irreverente de pedir uma cerveja, um elogio a uma pessoa bonita na rua, ou uma expressão oriunda do mais novo sucesso nas rádios. Às vezes aprendemos coisas que sequer possuem equivalentes em nossa língua mãe.

Além das novas palavras, os costumes são capazes de nos ensinar usos novos para palavras conhecidas. O viajante Brasileiro, chegando em paris, vai aprender rapidinho uma nova forma de usar três velhas amigas; Bonjour / Merci / Au Revoir.

Em minha primeira viagem à cidade luz, não importa em qual estabelecimento eu entrava, grande ou pequeno, lá do fundo vinha uma voz “bonjour”.  Às vezes “bonjour?”. Como se houvesse um alarme laser na porta a disparar; “bonjour”.

Pensei comigo mesmo, quantas vezes entramos em um lugar privado sem anunciar nossa entrada? É realmente educado entrar em uma loja sem cumprimentar o balconista, ou o vendedor? Em Paris, dizer “bonjour” soa tão natural que nos sentimos “invadindo” um local ao entrar desta forma. Rapidinho nós estamos usando Bonjour como se deve. O mesmo acontece na saída.

Aí de quem se retira sem Merci ou Au Revoir, ou sua metamorfose Mercivoir. Mesmo que não se compre nada, ao se dirigir para a porta de saída somos puxados como um imã.  Os garçons, balconistas, seguranças olham com estranhamento e perguntam “au revoir?”.  Logo um francês passa ao seu lado e declama “mercivoir”. Aprende-se rápido em terreno estrangeiro.

Logo logo em todo lugar em que entrava, eu dizia bonjour na chegada e “merci, au revoir” na saída. Sempre respondido por um simpático “mercivoir”, para abreviar. Paris se tornava cada vez mais Rose.

Muitas vezes os franceses são acusados de serem grossos e mal-educados. Mas se olharmos no espelho, será que estamos fazendo nossa parte? Mesmo para o viajante que não fala francês, as três palavras mágicas devem estar sempre no bolso. Sendo simpático na entrada, eles poderão até perguntar “speak english?” se sentirem que seu francês ainda está no nível básico, alguns vão até se arriscar no português.  Entrar e sair dos cafés parisienses desta forma, se torna um prazer ainda maior, e digo com peito cheio ao ir embora minha nova palavra favorita em francês;  “mercivoir”

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*Publicado originalmente em New Routes / Nouvelles Routes #53 – @ Disal editora Maio 2014 ISSN 1516-3601

Reprodução – resenha

outubro 24, 2013 § Deixe um comentário

Eu não li o Filho da Mãe, livro do Bernardo Carvalho muito elogiado e também parte da coleção Amores Expressos. Nem quando eu o vi traduzido para o francês – o que é um grande mérito, atravessar o oceano um autor brasileiro. Sempre esteve na lista de próximo, mas passando na frente da loja da Companhia das Letras vi a capa do novo trabalho do autor “Reprodução” a capa com a faixa verde-acqua e uma grande muvuca parecendo um parlamento ou uma bolsa de valores. Chamou minha atenção e decidi não perder tempo, queimando a fila, peguei o livro para devorar em apenas 2 dias.

reprodução bernardo

Devo dizer que foi difícil terminar o livro, quase desisti. A narrativa se mostrou muito diferente do que estava descrito na contracapa. Tipo aqueles casos onde o trailler é melhor que o filme, nest caso a orelha é melhor do que o romance . Não que o livro seja ruim! Mas no resumo do livro algums pontos são levantados com ênfase quando não passam de meros detalhes na narrativa. Defender o “típico personagem da nossa era” é um exagero sem tamanho, até por que não acho que ninguém irá se identificar com o personagem, ainda mais por que “o comentarista de blogs e portais da internet” fala muito pouco sobre ele. Melhor definido mesmo como “vive entre a realidade e a paranóia”.

A narrativa, em discurso direto, me lembrou Meursault, herói do livro de Camus, L’etranger. Livro que exige fôlego para ler, tamanho absurdo o desencadear de idéias do personagem. No livro de Bernardo o fôlego precisa ser ainda maior, pois o primeiro capitulo se arrasta por 50 paginas de um monólogo paranóico. No segundo capítulo, outra longa dose no mesmo estilo… só que sem saber direito pra que serve na trama, a vontade é de pular as paginas.

Entertanto, mesmo com um caminho tão difícil, ao final da leitura a sensação é de termos feito uma viagem profunda. O “estudante de chinês” conseguiu deixar sua marca, o texto consegue se sustentar como um retrato louco destes tempos loucos. Posso então recomendar a leitura deste livro, e que seja feita de maneira rápida, uma sentada pra cada capítulo, pulando algumas páginas se lhe convir. Pois é um livro capaz de nos fazer sentir mudados.